sexta-feira, 25 de abril de 2014

 Ministra da cultura Marta Suplicy com comitiva da Casa de Oxumarê

"Não se pode negar que os terreiros de candomblé, além de espaços sagrados e religiosos, são símbolos de resistência de um povo, que mesmo passando por diversas dificuldades conseguiram preservar a sua história e tradição. Os terreiros tem histórias que precisam ser contadas".
Foi com essas palavras que a Ministra da Cultura, Marta Suplicy anunciou o reconhecimento da Casa de Oxumarê como patrimônio histórico cultural, tornando dessa forma, o sétimo terreiro de candomblé do Brasil a ser tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN. A solenidade de reconhecimento, foi realizada no dia 27 de novembro, em Brasília, na sede do IPHAN, durante a última reunião do Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural. Além da Casa de Oxumarê, o Teatro Castro Alves também foi reconhecido como patrimônio.
Ao ser informado que o processo de tombamento da Casa de Oxumarê foi aprovado por unanimidade e sem ressalvas pelos conselheiros do IPHAN, Sivanilton Encarnação da Mata, mais conhecido como Babá Pecê, Babalorixá do templo religioso, não conseguiu esconder a emoção. "É uma luta antiga que começou com meus ancestrais. Me sinto honrado, mas ao mesmo tempo reconheço que é preciso seguir em frente. Sabemos que várias casas de matriz africanas são invadidas diariamente, são vítimas do desrespeito e da intolerância. Devemos reconhecer e assegurar a existência de todos os terreiros. Onde se cultua Orixá, Inkisis, Voduns, são espaços sagrados", disse o sacerdote, para em seguida completar. "É um momento histórico. Esse tombamento é o reconhecimento de toda contribuição do povo africano para a história do Brasil".
Diretor de Patrimônio da Fundação Palmares, Alexandro Reis destacou a contribuição dos terreiros para a preservação de ritos e atos que já foram extintos, no próprio continente africano. Vivemos um momento histórico vivido no país, onde se consolidam as políticas de ações afirmativas pelo poder público e sociedade na superação das desigualdades. Ações como essa, de reconhecer um terreiro como patrimônio demonstram o nosso compromisso com a promoção da igualdade", ressaltou.

História de Luta - A solicitação de tombamento do Ilê Axé Oxumarê – considerado um dos mais antigos espaços de realização de cultos das religiões de afro-brasileiras da Bahia e de grande reconhecimento social – foi feita em 18 de setembro de 2002, pelo sacerdote Babalorixá Sivanilton Encarnação da Mata, com a ajuda de outros integrantes da comunidade do Axé. Mas, em 2006, o projeto foi arquivado por não ter documentação suficiente. Foi quando Babé Pecê reuniu uma nova equipe e conseguiu organizar todos documentos exigidos pelo IPHAN. Um novo laudo foi realizado, dessa vez pelo historiador e antropólogo, professor Ordep Serra.
"A Casa de Oxumarê conseguiu manter a tradição, preservou saberes e isso merece ser conservado. É um patrimônio. Esse título, o reconhecimento do IPHAN, apenas atesta o que já sabíamos, temos um grande legado da história africana nesse terreiro", disse o professor.Para o Diretor do Departamento de Proteção ao Patrimônio Afro-Brasileiro da Fundação Palmares, Alexandre Reis, o tombamento reafirma o momento histórico vivido no país onde se consolidam as políticas de ações afirmativas pelo poder público e sociedade na superação das desigualdades. Na mesma linha, a Senadora Lídice da Mata ressaltou os avanços frente ás políticas culturais de igualdade racial e celebrou ainda o tombamento do Teatro Castro Alves, também na Bahia. Só na cidade de Salvador há mais de mil sedes de cultos afro-brasileiros.

Patrimônio da Nação – A partir de agora, que foi reconhecida como patrimônio histórico e cultural, a Casa de Oxumarê, tem a preservação da sua memória e legado garantida. Suas características históricas, artísticas, estéticas, arquitetônicas, arqueológicas, documental e ambiental passam a ser administradas por tutela pública.
O tombamento é de reconhecimento do valor cultural de um bem, que o transforma em patrimônio oficial e institui regime jurídico especial de propriedade, levando em conta sua função social. Um bem cultural é "tombado" quando passa a figurar na relação de bens culturais que tiveram sua importância histórica, artística ou cultural reconhecida. Os bens tombados são inscritos nos quatro LIVROS DO TOMBO, conforme determinação do artigo 4º do DL 25/1937.

Sobre a Casa de Oxumarê

O Ilé Òsùmàrè Aràká Àse Ògòdó, conhecido como Casa de Òsùmàrè, é um dos mais antigos e tradicionais terreiros de candomblé da Bahia. Ao longo de sua história, contribuiu de modo significativo para preservar e difundir a cultura africana no Brasil. Guardiã e detentora de uma tradição milenar, a Casa perpetua o legado ancestral do culto aos Òrìsà, lançando as sementes do que hoje representa o candomblé para o país e o mundo. Faz parte do panteão das casas matrizes responsáveis pela construção da religiosidade afro-brasileira.
A história da Casa de Òsùmàrè remete à formação do candomblé no Brasil. Sua origem remonta ao início do século XIX, e foi marcada pela luta e resistência de africanos escravizados que, obrigados a abandonarem suas terras e laços familiares, não renunciaram a sua cultura e fé.
Em 15 de abril de 2002, a Fundação Cultural Palmares reconheceu a Casa de Òsùmàrè como território cultural afro-brasileiro, atestando sua permanente contribuição pela preservação da história dos povos africanos no Brasil. Dois anos depois, em 15 de dezembro de 2004, foi registrado em livro de tombo do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia – IPAC como patrimônio material e imaterial do Estado.
Além de desenvolver atividades religiosas, a Casa de Òsùmàrè é ativamente engajada em projetos sociais e culturais, que contribuem para o desenvolvimento e inclusão das comunidades do seu entorno. Comprometida na luta contra o preconceito e a intolerância religiosa, possui um extenso histórico de realização de atividades e ações que visam a valorizar o legado cultural afro-brasileiro e garantir o direito de cada cidadão em professar livremente sua fé. Para melhor desempenhar estas funções, em 1988, institucionalizou-se sob a denominação, Associação Cultural e Religiosa São Salvador.
Seriam necessários inúmeros livros para registrar e narrar o histórico de lutas, resistência e fé dos africanos e seus descendentes, que contaram com a força atuante dos Òrìsà para preservar e transmitir o inestimável legado cultural e religioso que identifica e fortalece filhos de santo em todo o Brasil.
Contar parte da história da Casa de Òsùmàrè é uma forma de compartilhar com a sociedade um patrimônio, preservado há quase dois séculos.

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